Em primeiro lugar, vamos afirmar: não há nada de errado em tomar uma latinha de refrigerante. Naqueles momentos mais quentes do dia, a bebida refresca, reanima e até melhora o humor. Vale o mesmo para uma fatia de pizza, a macarronada da mama, o bombom trufado, pequenos prazeres que podemos nos proporcionar.
Mas é necessário manter a moderação, inclusive porque um prazer é sempre anulado quando cai na rotina. Reservada para alguns momentos especiais, uma latinha de refrigerante não provoca grandes danos – nada que o corpo não consiga corrigir em duas ou três horas. O excesso, no entanto, é muito prejudicial, e o corpo reage a esta “invasão”.
Até água
Todo e qualquer exagero é nocivo à saúde e ao bem estar. Até a água pode trazer problemas: existem relatos de mortes de usuários de ecstasy, depois de ingerirem litros na tentativa de se reidratar. E um sexto dos maratonistas desenvolve hiponatremia, de acordo com estudo pesquisado no “New England Journal of Medicine” em 2005.
O palavrão (hiponatremia) é o termo técnico para diluição do sangue. Mais exatamente, trata-se de um transtorno dos eletrólitos (sais minerais necessários ao nosso metabolismo), que ocorre quando a quantidade de sais dissolvidos no sangue fica abaixo de 135 milimoles por litro. O distúrbio provoca vômitos, cefaleia, fadiga, micção frequente e confusão mental.
Casos graves de hiponatremia rápida chegam a provocar edema cerebral (entrada anormal de líquido nos neurônios), que se manifesta sob a forma de convulsões, coma, falha respiratória, hérnia cerebral e até a morte.
De volta à latinha de refrigerante
O principal problema das quase irresistíveis latinhas de refrigerante é o elevado teor de açúcar. Em 2014, George Prior, um americano de 50 anos, decidiu fazer um experimento com o próprio corpo: tomar dez latas de Coca-Cola por dia durante um mês. Isto equivale a ingerir 500 gramas diários de açúcar refinado (que não tem nenhum valor nutricional).
O “estudo”, acompanhado pelo jornal inglês “Daily Mail”, evidentemente não rendeu bons resultados. O antes atlético e saudável Prior viu a pressão arterial subir de 12 por 7 para 14 por 9, engordou nove quilos, perdeu massa muscular e viu o abdômen dilatar-se como se fosse em um passe de mágica.
É claro que ninguém minimamente equilibrado repetiria esta maluquice, mas, mesmo em pequenas doses, o corpo reage muito mal ao consumo regular de refrigerantes. Não é necessário esperar um mês: os estragos começam a surgir em poucos minutos.
O cronograma do refrigerante
• Dez minutos
Uma lata de refrigerante normal possui o equivalente a dez colheres (sopa) de açúcar refinado. Quem está pensando em recorrer às versões light, diet ou zero deve tomar cuidado: parte do açúcar é eliminada no processo de produção, mas, em compensação, aumentam o teor de sódio, para realçar o sabor.
Seria o caso de se perguntar: como o organismo suporta esta verdadeira overdose de glicose? Trata-se de um avanço tecnológico: a indústria de refrigerantes adiciona ácido fosfórico (especialmente no caso dos refrigerantes de cola), que age como acidulante – ou seja, confere um sabor mais ácido, disfarçando a doçura extrema.
Em dez minutos (ou menos), portanto, os entusiastas das latinhas de refrigerantes ingerem a quantidade de açúcar recomendada para um dia inteiro (para pessoas de saúde regular). Vale lembrar que o açúcar refinado é considerado “caloria vazia”: engorda, mas apresenta nenhum valor nutritivo para o organismo; apenas acelera o metabolismo por alguns instantes.
• 20 minutos
O corpo precisa reagir a este verdadeiro ataque. Por isto, cerca de 20 minutos depois de “toda a refrescância e sabor”, o cérebro determina o aumento da produção de insulina, hormônio produzido pelo pâncreas cuja função é permitir a entrada de glicose nas células, para que, em contato com o oxigênio, o nutriente seja transformado em energia.
Não é possível, no entanto, aproveitar dez colheres de açúcar de uma única vez. Por isto, o fígado entra em cena e transforma o excedente em gordura, uma das poucas substâncias que o nosso corpo é capaz de estocar.
Estes depósitos são transformados em energia nos períodos de escassez de alimento – e isto pode significar inclusive a permanência em jejum por mais de quatro horas. Contudo, não é possível utilizar todo o estoque, que acaba se revelando no abdômen, quadris e coxas.
• 40 minutos
A cafeína presente no refrigerante começa a se manifestar. As pupilas se dilatam, a pressão arterial sobe e o fígado tenta corrigir o excesso, enviando mais açúcar para a corrente sanguínea. Aumenta a produção de dopamina, neurotransmissor relacionado ao bem estar. Praticamente, a pessoa fica “elétrica”.
Alguns estudos indicam que o consumo de refrigerante torna as pessoas momentaneamente mais produtivas e ativas, mas também potencializa a agressividade. Com o consumo regular (uma latinha diária, por exemplo), o organismo se acostuma com a dose e passa a “querer mais”.
• 50 minutos
O sistema digestório começa a digerir os sais do refrigerante. O ácido fosfórico aumenta a velocidade da absorção, “empurrando” cálcio, fósforo, potássio e outros minerais para o intestino grosso, órgão responsável pelo aproveitamento dos eletrólitos.
A toda ação corresponde uma reação, de igual intensidade e sentido oposto. Esta é uma das leis clássicas da Física. A pressa em absorver os sais determina um estímulo para os rins, que começam a eliminar os excessos. O problema é que eletrólitos perfeitamente aproveitáveis também são eliminados. A carência de cálcio, por exemplo, é a responsável, no médio prazo, pelo desenvolvimento de artrites, artroses e osteoporose.
Outros problemas ocasionados pelo refrigerante
A carência de sais minerais provoca diversos males, de cãibras pontuais à elevação dos radicais livres. Resultados mínimos: sobrepeso, obesidade, hipertensão arterial (com a consequente predisposição para doenças cardiovasculares) e doenças metabólicas, como o diabetes.
As cáries também surgem com mais frequência. Mesmo com a correta higiene bucal, uma latinha de refrigerante tem tanto açúcar e ácidos que o esmalte dos dentes é corroído em muito pouco tempo. As cáries são apenas mais uma consequência.
O açúcar e a cafeína dos refris também respondem pelo desenvolvimento de gastrites e úlceras do estômago e do duodeno. Além disto, estas substâncias interferem nos mecanismos do sono, provocando insônia e as inevitáveis dores de cabeça, fadiga, irritação, etc.
O melhor a ser feito, desta forma, é reduzir – ou simplesmente trocar as latinhas por sucos naturais – igualmente saborosos e sem efeitos colaterais (basta escolher as frutas certas para o biotipo). Desta forma, é possível brindar ao calor do domingão com um refrigerante. Saúde!