Alimentos orgânicos vs. Alimentos convencionais

Com o crescimento da agropecuária comercial e da indústria alimentícia, surgiram novos problemas: improdutividade, praças nas plantações, doenças no gado, dificuldades para escoar a produção. A ciência (mais especificamente a indústria farmacêutica) ofereceu boas respostas, aparentemente, para superar estas dificuldades.

Surgiram, então, os defensivos agrícolas – fertilizantes, herbicidas, pesticidas, etc. – vacinas, medicamentos e produtos à base de hormônios para acelerar o crescimento dos animais. Surgiram os alimentos “tradicionais”, da forma como os conhecemos atualmente. Mas ainda falta um “capítulo nesta novela”.

Modernidade

Até as primeiras décadas do século XX, a produção agropecuária tinha como destino principalmente as feiras livres e os entrepostos comerciais. Aos poucos, a indústria de transformação de alimentos se impôs: o tomate maduro (quase estragado), que era cozido durante toda a manhã de domingo, para a “macarronada da mama”, deu lugar ao molho pronto de tomate. Este é só um exemplo.

Progressivamente, mais e mais produtos deixaram de chegar in natura até as nossas despensas. Em São Paulo, um marco da modernidade – a Praça Roosevelt, no centro da cidade, uma praça sem árvores – foi inaugurado em 1970, tendo como principal atração um supermercado.

Não há nada contra os grandes centros de compras, mas o desenvolvimento da indústria de alimentos só foi possível com a criação de produtos destinados ao prolongamento da vida útil dos itens da pecuária e hortifrutigranjeiros: os conservantes, acidulantes, espessantes e outros compostos químicos para “preservar” o sabor.

Tudo isto era visto como sinal de modernidade. Era um fenômeno semelhante ao de um cidadão que observa as chaminés de uma fábrica emitindo fumaça negra e encobrindo a luz do Sol e sentir despertar quase inconscientemente um sentimento de ufanismo. Congestionamentos em “vias rápidas” despertavam o mesmo sentimento.

A hora da virada

No final dos anos 1970, as coisas começaram a mudar. Em um mundo cada vez mais dependente do petróleo e seus derivados, que se tornaram extremamente caros no início da década. Surgiu a necessidade de desenvolver nova matriz energética e com ela, talvez, tenha nascido uma consciência ecológica.

Mais provavelmente, porém, esta nova consciência tenha surgido em função dos abusos cometidos pela humanidade em busca de conforto e bem-estar. Derramamentos de combustíveis no mar, queimadas e derrubadas de florestas tropicais e, talvez, o pior: degradação de áreas, com a invasão (e favelização) por pessoas sem recursos, sob as vistas grossas das autoridades

Isto ocorreu, por exemplo, na Vila Socó (Cubatão, SP), onde um incêndio iniciado nos dutos da Refinaria de Capuava matou oficialmente, em 1984, 94 pessoas. O número deve estar subestimado, já que moradores afirmavam ter parentes e vizinhos que nunca mais foram vistos.

Orgânicos

Com a casa arrumada (ao pelo menos com a constatação de que não dava mais para viver na bagunça), chegou a hora de organizar também o corpo. No início dos anos 1980, houve um boom de matrículas em academias. A alimentação precisava acompanhar a iniciativa e surgiu a vez da alimentação saudável.

Um número cada vez maior de pessoas passou a reduzir o consumo de carne vermelha, das frituras, dos alimentos processados, dos alimentos refinados (farinhas, açúcar, etc.). Isto, porém, não era suficiente, como logo se viu.

Os defensivos agrícolas, que aumentavam a produtividade das lavouras, passaram a surgir como vilões (ou mais uma gangue de vilões, uma vez que a lista já era extensa). De defensivos, eles passaram a ser conhecidos como agrotóxicos.

A diferença entre alimentos orgânicos e convencionais é justamente esta: na agricultura comercial, os legumes, verduras, frutas e tubérculos recebem doses cavalares de produtos agrícolas para acelerar o desenvolvimento, evitar perdas, reduzir os parasitas que infestam as plantações e, com isto, aumentar a produtividade.

Nas hortas e pomares orgânicos, o desenvolvimento ocorre naturalmente, de acordo com o ciclo de cada espécie. Os animais recebem rações livres de agrotóxicos e não tomam nenhum tipo de antibióticos, nem hormônios de crescimento. Os únicos medicamentos permitidos são vermífugos, fitoterápicos, homeopáticos e vacinas obrigatórias.

As diferenças dos alimentos orgânicos vs. alimentos convencionais

• Os animais sem criação orgânica recebem rações produzidas a partir de plantas cultivadas com adubos químicos e fertilizantes sintéticos. Antes do abate, em algum momento do desenvolvimento, a criação recebe hormônios, para crescer com mais rapidez.

• Os alimentos orgânicos são mais ricos em nutrientes. Nas lavouras tradicionais, as plantas recebem radiações ionizantes (destinadas a esterilizar e desinfetar as mudas). Com isto, elas retêm mais água, perdendo parte dos componentes nutricionais.

• Na aparência, quase todos os alimentos tradicionais vencem “de lavada”. Frutas e legumes são maiores e mais uniformes, sem manchas, e as peças de carne são maiores e parecem ser mais tenras. Elas realmente aparentam ser mais saborosas, mas isto ocorre porque os agrotóxicos impedem agressões externas e as plantas e animais usam todo o seu potencial para se desenvolver.

• No preço, a vantagem também é dos alimentos tradicionais. Estes itens são produzidos em larga escala, ocupam terrenos maiores e contam com mais incrementos e insumos. A agricultura orgânica é quase sempre familiar (algumas cooperativas) e ainda espera subsídios para se desenvolver.

Apesar de mais caros e mais “feios”, os alimentos orgânicos estão livres de adubos, fertilizantes, herbicidas, inseticidas, etc. Em alimentos processados, o trabalho é praticamente artesanal e dispensa a adição de adoçantes, acidulantes, conservantes, etc.

Defensivos sem controle

Com o uso de agrotóxicos, muitas vezes de forma descontrolada, é gerado um volume maior de alimentos em prazos mais curtos, mas estes produtos não apresentam a qualidade necessária para garantir a saúde e o bem-estar de seres humanos e animais domésticos. Os defensivos podem causar diversos problemas físicos, de dores de cabeça e reações alérgicas a distúrbios no sistema nervoso central e alguns tipos de câncer.

Em outubro de 2016, a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) divulgou o resultado de uma análise com 2.500 amostras (18 alimentos diferentes): é o PARA (Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos), realizado anualmente desde 2001.

Um terço destes produtos (todos orgânicos) apresentou níveis de contaminação. Além disto, foram identificados traços de agrotóxicos não permitidos para o tipo de alimento (por exemplo, defensivos indicados para batatas encontrados em morangos, frutas de casca fina e polpa macia).

A batata, aliás, foi o único vegetal que não apresentou nenhum lote contaminado. Na outra ponta da análise, 91,4% amostras de pimentão verde estavam contaminadas. Morango, pepino e alface também estão entre os mais contaminados.

Já está comprovado que o uso de aditivos químicos na agropecuária, apesar dos benefícios imediatos para a produção, é prejudicial à saúde no médio ou longo prazo. São necessários estudos mais detalhados para definir a forma de ação dos agrotóxicos, hormônios de crescimento & cia., mas é sabido que eles superexcitam o sistema imunológico.

Em outras palavras, da mesma forma que lavouras e criações passam a responder mais rápida e severamente a invasões e infestações, nosso organismo também fica “agitado”. O sistema imune em “alerta máximo” pode servir de gatilho a doenças como o diabetes tipo 2, câncer e obesidade.

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